Seis populares foram condenados a penas de multa que variam entre os 770 euros e os 1540, pela prática, em co-autoria e sob a forma tentada, de um crime de dano, por terem tentado fazer justiça pelas suas próprias mãos. “Partir pedras com marreta” Os factos remontam ao dia 6 de Dezembro de 2003, pelas 19 horas, quando seis populares, na aldeia do Camarnal (freguesia de Oliveira do Bairro) se introduziram num carreiro calcado - permite apenas a travessia de pessoas - que liga um lavadouro e um fontanário público a um outro arruamento, que está ladeado por terrenos, pertença de um casal. Este casal, não contente com a passagem diária da população, decidiu fechar o carreiro, por onde os populares, em geral, passavam para aceder ao lavadouro, colocando duas pedras de mil quilos cada uma, devidamente fixadas ao chão com recurso a uma fundação em betão. Os populares, apercebendo-se do que se estava a passar, resolveram partir uma das pedras com recurso a uma marreta, enquanto que outros espalharam o cimento que fora usado na construção das fundações que ainda se encontrava fresco, destruindo-as por completo. Segundo a sentença proferida, os arguidos agiram, em comunhão de esforços conforme plano previamente traçado, sabendo e querendo introduzir-se na dita passagem e danificar as pedras e fundações de cimento, uma vez que entendiam que a população, em geral, possuía o direito de ali passar. Os arguidos agiram com dolo na sua modalidade mais intensa, com dolo directo, ao perpetrar o crime. “Olho por olho e dente por dente” Na leitura da sentença, o juiz recordou que o sistema de administração da Justiça foi institucionalizado para aplicar, de uma forma imparcial e igualitária, a justiça em nome da comunidade e não a justiça pelas próprias mãos: “olho por olho e dente por dente”. Assim, os arguidos agiram de uma forma contrária ao dever jurídico-penal, já que deviam ter agido de acordo com lei. Em sede de audiência, todos os arguidos admitiram terem lá estado e o próprio presidente da Junta de Freguesia afirmou que o carreiro estava afecto à passagem, por aquele local, da generalidade dos cidadãos para o lavadouro e fontanário. No entanto, o tribunal não conseguiu apurar se efectivamente o carreiro era ou propriedade ou não do referido casal. Durante a audiência, os arguidos negaram terem provocado danos na pedra e afirmaram que não viram ninguém a executar uma conduta que pudesse causar danos. Contudo, as declarações não se mostraram, segundo o juiz, credíveis. Contradições “Na verdade, as declarações dos arguidos quanto ao modo como se deslocaram para o local e do que aí presenciaram mostraram-se pouco lógicas e até contraditórias entre si”, disse o juiz. “Admitindo que cada um dos arguidos que esteve no mesmo local e, assim, nas mesmas condições que os demais, não é compreensível que os arguidos, Emanuel, Carmélia, Graça e Arnaldo, aí tivessem conseguido visualizar todos os demais co-arguidos, que a arguida Vitália apenas conseguisse identificar como estando presente no local a arguida Maria Antónia e que esta e nem um dos demais tenha então reconhecido”. Os mesmos arguidos referiram em tribunal que no local estaria o povo de todo o lugar. Contudo, “o referido aglomerado de gente ora era constituído por 80 pessoas, como afirma a arguida Carmélia, ora por 50, como referiu a arguida Graça, para se limitar apenas 16 pessoas, conforme declarou o arguido Emanuel, número este bem mais aproximado aos apenas dez elementos referidos pelo casal que apresentou a queixa”. Lê-se ainda na sentença que o arguido Manuel referiu que constatou que as pedras tinham sido retiradas do local onde as mesmas haviam sido colocadas, sendo certo que as arguidas Carmélia e Maria Antónia constataram que o cimento tinha sido espalhado, facto que aquele incompreensivelmente não viu embora o cimento, obviamente, estivesse à vista face ao facto de as pedras terem sido deslocadas do local onde forma implantadas, conforme referiu. A menos que as pedras tenham exercido sobre os arguidos uma estranha atracção capaz de lhes toldar os sentidos”. “Tal incapacidade de consenso na descrição do que visualizaram é manifestamente estranha quando todos admitiram que permaneceram no local durante alguns minutos”, refere o juiz. Muitas outras contradições foram proferidas pelos arguidos, o que levou o juiz a questionar a existência da incapacidade visual momentânea de que uma arguida terá sido acometida. As contradições ainda se tornaram mais evidentes quando foram inquiridas as testemunhas de defesa que admitiram que se deslocaram ao local. Pedro Fontes da Costa pedro@jb.ptDiário de Aveiro |