O advogado da maioria dos arguidos do processo de aborto de Aveiro, João Peres, considerou hoje que a decisão da Relação de Coimbra implica a reformulação da sentença inicial mas não altera a absolvição dos 17 arguidos. Segundo o advogado, a Relação de Coimbra manteve a absolvição dos réus, decidida em Fevereiro de 2004, e até foi ao encontro da pretensão do recurso da defesa no que diz respeito à perca de bens do único médico envolvido. Em declarações à Agência Lusa, João Peres reclamou vitória no recurso decidido quarta-feira pelo Tribunal da Relação de Coimbra, que declarou nulo o acórdão de primeira instância e mandou reformular a decisão "para que sejam extirpados os vícios" contidos no veredicto. Segundo o advogado com escritório no Porto, aquele tribunal superior, ao mandar reformular a sentença inicial, acolheu o recurso da defesa contra a perca, a favor do Estado, do automóvel e de outros haveres do arguido que é médico. A decisão agora tomada pelo Tribunal da Relação de Coimbra surge na sequência da apresentação de dois recursos: um do Ministério Público (MP) e outro da defesa. Na interpretação de João Peres, a reformulação ordenada pela Relação de Coimbra não se prende com o recurso do MP, mas sim com o que ele próprio apresentou. João Peres insistiu no facto de a decisão da Relação não alterar em nada a absolvição dos 17 arguidos. "Quem ganhou o recurso foi a defesa", afirmou. A 17 de Fevereiro de 2004, o colectivo de juízes do Tribunal de Aveiro absolveu, por falta de provas concretas, 17 arguidos de um processo de aborto clandestino, incluindo o médico e sete mulheres acusadas de abortar. A sentença considerava, no entanto, provado que o médico "cometeu de forma livre e consciente interrupções da gravidez", revelando "uma enorme, e nada comum, insensibilidade perante a perseguição do Estado à sua actividade criminosa". O Ministério Público recorreu da decisão argumentando que havia contradições no acórdão do Tribunal de Aveiro, ao dar-se por provada a prática de aborto clandestino, em abstracto, ao mesmo tempo que se absolviam os arguidos por alegada falta de provas da prática dos crimes em concreto. A defesa também recorreu do acórdão da primeira instância, por não concordar com a apreensão do automóvel e de outros bens do médico, dado não ter sido provada a prática de nenhum aborto em concreto. No seu acórdão, os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra consideram que "não existe contradição insanável na situação ocorrida no texto da decisão, entre o tribunal [de Aveiro] ter dado como provada uma determinada decisão atinente à actividade e à personalidade do arguido e os factos concretos que depois considerou não terem acontecido". "Já quanto à contradição indicada entre esta facticidade abstracta e as consequências que o tribunal faz decorrer para o património do arguido (o médico), nos parece existir desconformidade legal", acrescentam os juízes da Relação de Coimbra, ordenando que sejam retirados os vícios encontrados no acórdão de Aveiro.Diário de Aveiro |