PARECE QUE ESTE É MESMO O TEMPO DOS CÓDIGOS

1. Parece que este é mesmo o tempo dos códigos. Não falamos dos “códigos de barras”, estes que dão cada vez mais que pensar nas contas à vida dos portugueses! Referimo-nos, claro, com toda a naturalidade e sem quaisquer publicidades, aos múltiplos códigos de autores nacionais e internacionais, que, por caminhos mais ou menos fantásticos, pretendem agora, finalmente, ao fim de tantos séculos, descobrir a última verdade, tendo nós até agora andado todos enganados!...

Naturalmente que hoje, em tempos de pós-modernidade, e já tendo integrado os desencantos sócio-políticos e científicos, mas vivendo nos vazios da ressaca à sua sombra, eis que a projecção da imaginação encontrou, no enredo de “código”, meias verdades e muitas mentiras, a “chama” que faltava ao ideal imaginário colectivo. O “código”, como itinerário, “fórmula”, caminho, que o espectador tem de percorrer até chegar ao final para aí encontrar a “solução”, nem que esta seja o “nada” ou a “não verdade”, é hoje o fascínio que atrai, fazendo sonhar um mundo diferente.

O escritor, no caminho dos Anéis, de Cristóvão Colombo, de Leonardo de Vinci, de Jesus, ?, sabiamente sabe envolver o leitor; este tem de saber ler, não “comer” tudo pela mesma medida, ter capacidade de visão crítica. Inteligentemente, e também para sua própria sobrevivência, o escritor, com meia dúzia de “factos”, que naturalmente (e até pela distância temporal) levantam as dúvidas saudáveis, faz desta possível dúvida de investigação a sua pura certeza que defende na obra, esta que, sendo decretada como “ficção literária”, coloca no leitor com menor maturidade os olhos de “história verdadeira”.

2. Quanto ao escritor, o “pão” está garantido! E quanto mais polémica, confusão, enredo, mistura de coisas sensíveis que tocam as pessoas com intenções ideológicas, mais vende? Neste tempo, quanto às instâncias envolvidas ou criticadas em obras de ficção (e em ficção pode-se dizer tudo, mesmo a maior mentira como sendo a mais pura das verdades!), a sabedoria obrigará um reaprender a situar-se, dando unicamente a importância relativa aos mundos da imaginação que o “vento” levará? Quanto às entidades que estudam a história, cuidado, não venha o mundo das “ilusões contemporâneas”, pela sua força mediática, reescrever a história na base da ficção. Quanto ao debate sério e esclarecedor sobre “tudo o que está em causa”, como desafios à procura da verdade comum, neste contexto, então venham os códigos!

Uma certeza estará garantida: os códigos que registam a época presente da literatura, haverão de cansar e “passar à história”! Por isso, merecem uma importância relativa, não sendo de sobrevalorizar. O mesmo se aplique, por exemplo e para nossa salvação, ao Festival da Eurovisão da Canção que, há dias, na Europa de Mozart, Chopin, Beatles, elegeu como melhor, votada em 24 países, uma canção de monstros, quase a tocar o satânico. Escandalosa falta de gosto?! Dar importância demasiada será tornar facto, sublinhar, valorizar como referência e paradigma, tudo isto, apesar de ser não ficção, mas um facto histórico, pela negativa, que o metal mais pesado tenha chegado a símbolo da canção europeia. Se é certo que quanto a gostos não se discute, também não é menos verdade que acreditamos em melhores gostos que virão? Num aliar de inovação e criatividade à “alma das gentes”! E já agora, onde estão as referências, o tão debatido “papel das elites” neste aperfeiçoamento, em tudo, colectivo?

3. ALGUNS DESAFIOS SÉRIOS DOS CÓDIGOS: Talvez seja de sublinhar a evidência de que importa ler como ficção aquilo que é ficção, e não fazer da ficção a “reescrita da história” pessoal e de referências comuns. Em sociedades da informação, cada vez mais ou as pessoas sabem o terreno que pisam e conhecem, de forma fundamentada, as sua próprias convicções e crenças ou então com a última “moda”, a pessoa pode embarcar na onda, porventura, da sua própria indignificação. Os “códigos” sedutores e especialistas na “destruição do tabu” não conhecem fronteiras e aparecem normalmente também associados ao “mágico” como substitutivo dos “anéis” esforçados do empenho, atenção, compromisso, verdade pessoal e colectiva, sendo publicações tanto mais procuradas quanto mais o “vazio” das grande verdades que fundamentam a humanidade se forem diluindo. Tais obras, estudadas como estratégia de comunicação mediática ao pormenor, são tantas vezes o sensível “momento” de descoberta no mágico enredo de “algo novo e diferente” que a pessoa nunca tinha ouvido falar, apesar de, nas Faculdades de Filosofia e Teologia, de forma acessível, tais factos serem aprofundados e estudados. Para as religiões, este é o tempo do grande desafio de se explicarem na linguagem mais acessível ao grande público as certezas, as dúvidas, as investigações sobre as questões da Fé, num aprofundamento e mesmo revisão de questões de fronteira (à luz das ciências humanas e neuro-ciências)? mas, na hora da verdade, quando se marca iniciativa esclarecedora e aberta sobre temáticas do género, claramente, os défices de participação demonstram, cabalmente, que a força colectiva destas “procuras” ainda não superou as “horas” do sensacionalismo.

Todavia, independentemente e acima de tudo, este esclarecimento com acções permanentes e abertas será o caminho de um maior enriquecimento de todos. Outros séculos felizmente já lá vão, e aos mais variados níveis, do “ocultar” da verdade, dos textos e da investigação. Sentir os “Códigos” como desafio e oportunidade de encontro e esclarecimento para todos é tão simples e tão evidente hoje como o dizermos, por exemplo, que existe, entre tantos outros escritos considerados apócrifos (sem “credibilidade”) um Evangelho de Tomé que apresenta peripécias sobre o Menino Jesus (Evangelho da Infância). A Igreja não o oculta e estudam-se tais realidades nas Universidades, mas é importante o público em geral sabê-lo. Não venha, nas vésperas da próxima Páscoa (como tem acontecido nestes últimos anos), algum escritor dizer esta “última” e vender milhões de livros. (A isto, que anda muito nas modas, e já agora sem ficção se diga, também poder-se-á chamar o “fácil oportunismo literário” com desonestidade intelectual.)

Para um trabalho sério e a sério nestes âmbitos, são muitas as Universidades no mundo que, todos os dias, investigam e publicam. Este tempo da “ficção” que vende e da “história” que se esquece, e não se está interessado em melhor conhecer, é uma imensidão de dúvidas que são desafios!


Alexandre Cruz *

*Centro Universitário de Fé e Cultura
Diário de Aveiro



Portal d'Aveiro - www.aveiro.co.pt