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01-04-2003

De mão estendida


Editorial

Editorial De mão estendida Somos hoje um povo de mão estendida. Mais do que nunca. Um povo eurodependente. Quem anda ou está de mão estendida são os pobres. Portugal é um país a abarrotar de pobres. Segundo recentes estatísticas, dois em cada três portugueses são pobres ou estão no limiar da pobreza, não já de saco de pedir, mas vivendo com grandes carências. De mão estendida andam também para aí os políticos de primeira água: Luis Filipe Menezes, presidente da Câmara de Gaia, lançando achas na fogueira e olhando para além do rio dizer que o Rui Rio navega noutras águas... de favor. Não se pode dizer tão mal do vizinho do lado ou ser tão invejoso. Com voz alargada e abrangente fala mesmo de perseguição por dizer algumas bocas, mesmo de discriminação relativamente a Porto e Lisboa, no que toca a verbas do PIDDAC. Fernando Rua, presidente da Associação Nacional de Municípios, ergue a voz e tenta pressionar o governo quanto aos limites de endividamento que não devem, na sua óptica, condicionar novos empréstimos para a construção de habitação social e para as obras cofinanciadas por fundos comunitários que eram excepções no Orçamento rectificativo e agora caíram na alçada das regras do emagrecimento. Um que perdeu o pio, sempre alteroso, foi João Jardim que, depois de uma bojardadas sobre o continente e o barco do governo, fez um estranho silêncio. Depois que Durão Barroso passou pela Madeira. Não creio que se tenha remetido apenas ao silêncio por via de vir a ser eleito vice do Partido Popular Europeu. João Alberto não se contenta com essas ninharias. Que se passou? Não se sabe muito bem, mas não faltam as más línguas a dizer que se o outro foi um Orçamento do Queijo, este será um Orçamento da Banana. O governo afirma que é um orçamento que não permite fantasias. É evidente que algumas autarquias virão a sofrer muito e terão de entrar em cura de emagrecimento. Nem todas, claro, mas algumas que praticaram verdadeiros desmandos e quase tocaram os limites permitidos para endividamento. Agora, com o aperto do cinto, não sabem como gerar receitas e muito menos como acabar obras e cumprir promessas eleitorais. Algumas estarão perfeitamente no fio da navalha. Nenhuma da Bairrada estará nestas condições e apertos.Ainda para cúmulo, o tapete foi-lhes tirado pelo governo ainda muito em cima da campanha eleitoral que é a altura aprazada para parte dos políticos darem um ar da sua graça, lançando umas obras e acabando outras. Agora, torcem a orelha e quem vai pagar um pouco serão as populações. Ou alguns funcionários que podem vir a ser dispensados. É que por vezes há gente a mais, agregada aos serviços das câmaras. Pelas mais diversas razões políticas ou meramente humanas. E também há pessoas sub-aproveitadas, com um pé a pedir licença a outro para mexer uma palha ou uma pontinha de relva que seja. No momento o descontentamento também vem dos autarcas de todas as cores. Já não bastam as ameaças dos sindicatos, as greves dos funcionários públicos. Coitado do lavrador! Como sempre, é quem amouxa e não barafusta. Mesmo aqueles que perderam todos os tomates com as chuvadas, os que vão à mesa, que os outros já há muito se perderam neste pais... de brinquedo. À beira da falência moral, por arrasto de outos males. Uma coisa não entendemos: como é que estando o país um verdadeiro buraco não só nas finanças, mas também na confiança e nos comportamentos, poucos são os que estão dispostos à cura de emagrecimento. Os mais jovens querem viver num mundo cor-de-rosa com facilidades a bater-lhes à porta e dinheiro caindo no regaço. Só os que estão no limiar da reforma, quando muito os que estão no meio caminho andado, entendem o que é fazer um pouco de sacrifício a favor de todos, porque vêm do tempo das mil privações. A propósito das greves, fixámos uma situação, aqui bem perto de nós, na Câmara de Mira. Com um buraco de um milhão e quatrocentos mil contos, ninguém aderiu à greve. Entenderam os trabalhadores que, com um buraco daqueles, não era para brincar às greves, tanto mais que já tinham participado um ano e isso pesou-lhes no vencimento. Comparativamente a este buraco, há o buraco nas finanças a nível do Estado, uma pesada herança que os cabouqueiros em vez de darem uma mão para ajudar a tapar, procuram, com todo o género de truculências impedir que se feche ao menos um bocadinho para não levarmos com umas reguadas da Comunidade Europeia. Truculências que roçam a malcriadez. Veja-se Ferro Rodrigues a chamar nomes aos deputados do governo, palermas, disse que eram. A Assembleia a bater também no fundo... Apalermados ficam naturalmente os portugueses que cada vez se revêem menos na política que vai enxundiosa e baixa como a lama das sarjetas. E nos políticos que passam uma tardada à volta dos dicionários a ver se encontravam o significado mais verrinoso ou mais suave para este insulto. Afinal, será que ninguém tem medo deste buraco nacional, nosso, porque naturalmente em muitas circunstâncias e por muitos motivos, até tenhamos contribuído para isso, como mostram os funcionários da câmara de Mira ter medo do “seu”? Não há dúvida: com uma série de problemas por resolver, a criminalidade violenta a aumentar, os militares também a quererem não pagarem a crise, o investimento a diminuir, tal como a confiança dos agentes económicos, e com todas as provas dadas de inconsciência por parte de muita gente, o governo está feito! Ou feitos estamos nós. (23 Out / 11:23)

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