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NOTÍCIAS | | | 16-03-2004
| Faleceu o decano dos nossos correspondentes
| Ouca |
| Aos 86 anos, deixou de bater o coração de Eurico Pena, o decano de todos os correspondentes locais de Jornal da Bairrada que serviu durante décadas, com muita paixão e zelo exemplar. Era activo quanto baste e contam-se pelos dedos as semanas em que não passava para o quinzenário e depois semanário notícias da sua querida Ouca, que ajudou a emancipar-se de Soza. Isso acontecia no geral apenas na semana que, depois do falecimento da esposa, tirava para se refugiar em Fátima, numa espécie de retiro, para se recompor do corpo e do espírito.
Ouca de que guardava memórias como ninguém, não só relativas à nova freguesia civil, como religiosa. Teve o privilégio e a ousadia de estar nesses momentos, de alma e coração, e nos primeiros passos De resto, ele, com a provecta idade que tinha, não mostrava fragilidades a nível intelectual e mostrava alguma esperança em que, um dia, essas memórias fossem publicadas, desiderato que já não viu em vida.
Sem querermos meter foice em seara alheia, bem andaria a junta de Ouca em aproveitar este espólio, para que a história desta jovem freguesia não se perca. Ainda nos prometemos a ler os trabalhos e a ajudar na sua publicação, porque entendemos que a história das nossa terras é sempre tão pouca, que vale a pena aproveitar o que as bibliotecas humanas nos facultam. Será o caso. A freguesia, que tanto amou, necessita desse contributo e Eurico Pena merece que não se deixem eternamente no esquecimento essas páginas, porque quem mais perderá será a terra.
Eurico Pena gostava de escrever e levar aos outros as notícias da sua terra. Uma vez convidado, não mais largou o leme. Fazia-o com dedicação extrema. Ao ponto de se deslocar a nossa casa (Águas Boas), ao domingo, de tarde, para nos entregar as notícias, sempre dentro de um envelope. Se estava, ficávamos um bocado à conversa, onde nos apercebemos desse sonho que era dar à estampa as suas memórias. Era um conversador nato, um homem de esmerada educação.
Deslocava-se numa carocha, mas até de bicicleta. Isso é lembrado no livro “Jornal da Bairrada meio século ao serviço da região”, deste modo:
“Não podemos deixar de citar um caso paradigmático do amor e da dedicação ao jornal. Eurico Pena é um octogenário (84 anos) e o correspondente com mais anos de vida, que não de jornal, porque esse desiderato pertence ao Manuel Oliveira Martins e Silva, da Fogueira e Manuel Calado, que, todos os santos domingos, vem a nossa casa. A maior parte das vezes, no seu velho wolkswagem verde (a que muitos chamam carocha), mas já tem acontecido ou porque a relíquia estava com alguma avaria ou porque o trânsito era muito e o filho lhe recomendava com insistência a necessidade de redobrados cuidados, que, tenha feito a viagem, entre Ouca e Águas Boas, na velha pasteleira, a fim de trazer a notícia, pagamento de assinatura, dar dois dedos de conversa porque é um conversador nato. Este, um verdadeiro exemplo desta plêiade de correspondentes locais que ao jornal têm dado, e continuarão a dar, muito trabalho, muito esforço e dedicação. Também por bairrismo e amor às suas gentes, às suas terras. Quem melhor sente o palpitar do coração das gentes do que eles?”
Homem culto e amante da leitura - recebia em casa vários jornais, até de longe - também gostava de fazer os seus versos. De resto, mostrava essa veia em todos os almoços de aniversário do jornal. A par de outro poeta popular, a residir também em Ouca, Francisco dos Santos. Foi num desses almoços (1988) que pela primeira vez nos conhecemos, um ano antes de assumirmos a redacção de “Jornal da Bairrada” que ele considerava “o elo de ligação que faz lembrar para muitos a paixão do torrão natal. Quantas vezes ao longo de todos estes anos, agarro na pena para escrever, por vezes leves notícias, com o fim de satisfazer a curiosidade, aliás, justa, das pessoas que lá longe, em terras de acolhimento, esperam ansiosas por ver notícias das suas gentes” (1)
Partiu Eurico Pena, ao fim de uma vida cheia, e, para todos quantos o conheceram em muitos momentos, nomeadamente as pessoas ligadas a este jornal, é já uma grata saudade, mas sobretudo para todos resta o e exemplo de um homem bom e probo e de um colaborador excepcionalmente dedicado à sua terra e ao jornal que começou a servir na década de sessenta.
Paz à sua alma.
O GRANDE DESEJO
Eurico Pena, preocupado com a sua sucessão, um dia escrevia: “o que mais me interessa é que surja alguém que abrace com bairrismo a paixão de ver o nome de Ouca nas colunas deste jornal.
Estou esperançado disso, darem continuidade com esta missão, para bem da terra, para bem do Jornal da Bairrada, que o mesmo é dizer para bem da sua e nossa região”.
Solução proposta que fomos sempre recusando, mas agora com o seu passamento, é altura de deixar aqui um repto, ainda em sua memória, para que alguém apareça a substitui-lo.
Contamos que isso aconteça em breve.
JB, 15 de Fevereiro de 1951
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