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24-08-2006

A centenária ouviu os parabéns de familiares e amigos


Sangalhos Maria da Silva comemorou 100 anos

Maria da Silva é segundo nos revelaram alguns familiares, neste momento, a habitante mais idosa de Sangalhos. Celebrou, no passado dia 15 - Dia de Nª Sª da Ascensão, de quem é devota, 100 anos de vida, embora reze, todos os dias, durante muitas horas, a todos os santos, “pelo mundo que está tão mal” disse-nos.

Sem dúvida, uma referência de longevidade, recordando ainda com alguma facilidade, factos da sua meninice e juventude, de uma vida marcada pelo sofrimento e muito trabalho.

Nascida e criada em Vila Chã de S.Roque, Oliveira de Azeméis, foi a mais nova de quatro irmãos - a única ainda viva (dois rapazes e duas raparigas), nascidos no seio da família Silva (António Silva, sapateiro de profissão e Joana Correia da Costa).

Mulher de guerra

Foi em Sangalhos, na casa da mais velha de quatros netos (Isilda Pinto, dona dos Bilhares Castros), onde reside vai para 26 anos que a fomos conhecer.

Embora cansada pelo dia agitado que vivera na véspera, (a festa de aniversário reuniu cerca de meia centena de familiares, amigos e vizinhos) Maria da Silva recebeu-nos com um sorriso, assim que começámos a falar com ela.

Fomos encontrá-la no quarto, quando se preparava para a entrevista com JB, no momento em que, sozinha, penteava os seus longos e sedosos cabelos brancos que zela diariamente.

Cega há dois anos, ainda hoje se sente revoltada com tal destino, pois gostava de “ver e acompanhar o crescimento dos oito bisnetos que começam a mudar as feições, com a idade”.

Embora o corpo (desde que cegou) peça mais cama e descanso, veio até à sala falar-nos. Mesmo assim, foi preciso puxar por ela, pois tão cansada que estava, de vez em quando, aproveitava para dormitar um pouco.

Contou-nos que nasceu a 15 de Agosto de 1906 e que foi casada com António Dias Almeida (já falecido) que a abandonou, andava ela grávida, de dois meses, da sua única filha, Júlia Conceição Silva (entretanto também já falecida).

Foram os seus pais e o seu trabalho que ajudaram a criar a filha. Mulher de guerra, trabalhava desde que o sol nascia até que se punha, para poder dar instrução à filha que trouxe na escola até à 4ª classe.

Numa época em que as dificuldades eram muitas e as ajudas praticamente nenhumas, Maria da Silva trabalhava de sol a sol para se sustentar a si e à sua pequena Júlia. Tomou conta de crianças (uma dessas crianças que ajudou a educar é hoje padre que a trata ainda carinhosamente por “mãezinha”), lavou e passou roupa para fora, e foi leiteira.

Tempos difíceis e miseráveis

É precisamente dessa profissão que melhor se recorda. “Andava quilómetros, a pé, logo pela manhã e já de noite, pois tinha de ir a casa dos lavradores buscar o leite que levava para o Posto do Leite”, deixando a sua única filha, Júlia, ao cuidado de sua mãe.

A sua vinda para Sangalhos deveu-se ao facto do seu genro e filha (ambos já falecidos) terem fixado residência cá.

A JB recordou ainda os tempos difíceis e miseráveis da guerra que trouxeram fome e escassez de mantimentos (arroz, açúcar). Recordou a chegada da electricidade e de ter de recorrer a velas e candeeiros para se orientar na escuridão da noite. Passava a ferro para fora, recorrendo a um pesado ferro que funcionava a brasas.

Depois de um breve descanso, falou-nos ainda da sua mocidade, da desfolhada do milho em casa de lavradores ricos que, no final, proporcionava aos jovens trabalhadores um bailarico, brindado com fartura de pão quente, tremoços, café e vinho.

Três fatias de pão de forma

Quanto à alimentação, pasme-se o leitor, não vai muito além dos lacticínios e seus derivados, há já seis anos. De manhã, bebe uma caneca de café com leite e três fatias de pão de forma barrado com manteiga, doce ou queijo. Ao almoço, apenas um prato com Cerelac. À tarde, apenas um iogurte ou uma peça de fruta cozida e à noite o café com leite e pão de forma com manteiga. Nada mais, nada de carne ou peixe e muito menos sopa: “o meu estômago já não quer nada disso”, avançou-nos.

A terminar, não deixou de nos sussurrar gostar muito de ouvir cantar Tony Carreira e o padre Borga.

Catarina Cerca


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